Psicossomática
não deveria ser usada como um adjetivo para qualificar alguns tipos de doenças.
Porque, para os estudiosos que abordam o ser humano de forma integral,
psicossomática é um substantivo presente em toda forma de adoecimento,
incluindo todos os tipos de sintomas físicos, mentais, relacionais, familiares,
profissionais, sociais e espirituais. Por isso, pode-se afirmar com total
segurança de que qualquer sintoma é uma espécie de secreção simbólica que, de
forma violenta, viola o aparente equilíbrio do indivíduo para poder revelar, à
sua consciência, os segredos secretos do seu amor ferido. Ou seja, o sintoma é
um dos meios que a natureza psíquica utiliza para denunciar à consciência
egóica de que o indivíduo está cindido, desintegrado, separado ou dividido
neuroticamente.
Nessa
premissa, quando surge qualquer tipo de sintoma, ates de eliminá-lo, devemos
transformá-lo em um guia para o autoconhecimento, para evitarmos seu
reaparecimento recorrente ou o surgimento de novos sintomas mais graves e
mórbidos. Porém, em função da nossa sociedade estar cada vez mais fascinada e,
consequentemente, dominada pelo racionalismo científico, que pretende
normatizar tudo para manter a normalidade estática de tudo, e pelo capitalismo
neoliberal, que transforma tudo em negócio, objetivando lucro, acúmulo e poder
excludente, compreender psicossomaticamente os sintomas acaba sendo muito ruim,
pois irá expor toda doença nossa contemporânea, denunciando o quanto que o
normal está distante do natural, que é dinâmico e evolutivo.
Intimamente
sabemos que a natureza não pode ser controlada por muito tempo, e ao nos
tornarmos mais flexíveis, abrindo mão da ilusão do controle, diminuirão a
exuberância das crises e do descontrole e, com isso, relativizaremos as normas.
Portanto, os sintomas e as crises. Mas, quando surgem as crises e seus
sintomas, é necessário fazermos uma boa anamnese, equivalente a recordar -
relembrar ou rememorar as emoções - que estão associadas a cada sintoma,
incluindo a análise simbólica do órgão, do sistema, da função ou do tecido
doente, e as consequências deste sintoma, tanto no que o indivíduo deixou de
fazer, quanto no que ele passou a fazer, além de uma enorme gama de análises
que podem surgir, contribuindo para que a ferida secreta venha à tona.
Com
isso, nossas mágoas podem ser choradas para evitarmos que outros olhos ou
pessoas as chorem por nós. Assim como os ressentimentos, os sentimentos de
culpa, inferioridade, abandono, desejos de vingança, ansiedade ou medo, podem
ser reconhecidos, ressignificados e superados. Só assim a pessoa poderá
envelhecer com bom humor, condição essencial para que o sistema imunológico
atue eficientemente, pois está comprovado que ele reage imediatamente a
qualquer tipo de situação onde esses aspectos negativos estão atuantes no
psiquismo do indivíduo, deixando de ser funcional, chegando até a se voltar
contra o próprio organismo, como é o caso das doenças autoimunes.
Nossa
imunovigilancia é absolutamente capaz de nos deixar protegidos de qualquer
agente antigênico - de genética diferente da nossa - eliminando eficazmente
qualquer tipo de vírus, bactéria, fungo e até vermes nocivos. Além disso, o
sistema imunológico também tem competência de localizar e eliminar toda célula
aberrante que surge em decorrência do contínuo e natural processo de renovação
celular, onde a cada dia morre (por apoptose ou necrose) e nasce (por repasse
mitótico) cerca de um 1trilhão (principalmente, em tecidos epiteliais e
conjuntivos, responsáveis pelos revestimentos e pela sustentação do corpo), das
100 trilhões de células que possuímos. Sem esquecermos que temos dez
vezes mais microrganismos do que células, pertencentes a centenas de espécies,
vivendo simbioticamente em nosso organismo, também regulados pelo sistema
imunológico que, por sua vez, é absolutamente sensível às influencias negativas
do humor.
Essas
considerações servem para mostrar a magnitude e a importância do conhecimento e
da prática da psicossomática no âmbito da saúde. Por tudo isto o profissional
de saúde, independente da sua área de atuação, especialização ou formação,
deveria estar consciente dessas implicações para poder atuar, o melhor
possível, diante de todas as queixas trazidas por seus clientes, evitando a
simples supressão sem o bônus do autoconhecimento, advindo da ampliação
simbólica do mesmo. Além de adquirir a flexibilidade do relacionamento humano e
a capacidade de doação, onde os critérios técnicos são substituídos pela força
da ligação afetiva em busca da cura, que equivale à integração dos opostos por
meio do autoconhecimento, onde o natural pode se expressar livremente no normal
ou, infelizmente, na atual normose coletiva.
WALDEMAR MAGALDI FILHO. Psicólogo,
especialista em Psicologia Junguiana, Psicossomática e Homeopatia.